quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Os corpos da minha paisagem (1) - A propósito do pintor Edward Hopper


Edward Hopper (EUA, 1882-1967),  "Eleven A. M.", 1926


 Atraem-me os rostos do silêncio, habitantes urbanos de espaços fechados, na vã procura de um sinal que uma  janela virtualmente pode propiciar, embora esta mulher de Edward Hopper pressinta no seu íntimo que a fronteira é inexpugnável. O seu corpo nu parece aqui acentuar a vulnerabilidade daqueles que se sabem sulcados pela morte do desejo, por isso funciona como uma metáfora da desolação. O rosto está colocado de molde a esconder-se ao nosso olhar e os longos cabelos escuros, a contrastar com o marmóreo da pele, prolongam este indizível sentimento de ausência e clausura. O corpo torna-se então um objecto que faz a transição entre a escuridade dos móveis e a ilusória luz exterior. A postura é de expectativa, mas sem convicção, legível na pose das mãos. Os pés paradoxalmente calçados deixam pressentir uma eventual saída futura, mas em frente o seu olhar depara-se com as paredes dos prédios fronteiros, num significante bloqueamento. Nesta pintura o nu feminino perde qualquer dimensão erótica, pois o corpo coisifica-se nesta espera absurda. Quem poderá esperar? O amante infiel que a esqueceu definitivamente? O inviável anjo libertador? De qualquer modo, tanto a janela como o quadro suspenso na parede são meros simulacros de abertura ao exterior: a solidão é irreversível neste "Eleven A. M.".


Edward Hopper (1882-1967), "Sol numa sala vazia", 1963

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