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Abraham Harriton (1893-1986) - 6th Avenue Unemployement Agengy (1937 |
“O que é
preciso é criar quanto antes novas elites […]
Não elites que
nos subjuguem – mas elites que
nos conduzam para a beleza e para a justiça...”
Raul
Brandão, Memórias,
v. III (ed. Póstuma,1933)
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Rudolf Dischinger (1904-1988) - Ameaça (1935) |
Embora
numa linguagem datada, esta aspiração brandoniana tem
hoje toda
a sua pertinência tanto no plano nacional como no europeu. A
falência de ideais coloca-nos sob o jugo absoluto
do poder financeiro e dos seus servis executores políticos,
habilitados com uma retórica contabilística e de endeusamento dos
mercados. Mas, paradoxalmente, estes
nem sequer fizeram ou fazem
do país ao menos
uma mercearia bem organizada. A
cultura é tratada como luxo parasitário, o supérfluo que apenas
alguns pretensos intelectuais se atrevem a defender. O circo
mediático cumpre a sua nobre função de aniquilamento do que resta
do espírito crítico dos portugueses. Mas há outros luxos a
combater, tal o caso do democrático direito à Saúde e à Educação.
Tudo em nome da nobre missão dos actuais governantes de salvar o
país da bancarrota. Eles têm a bandeira na lapela, um
sinal para ocultar a imperativa acção de resguardar os interesses
usurários
dos nossos credores, nobre cruzada nesta mascarada trágico-cómica
de venda de Portugal a
retalho. E, numa Europa,
feita nau à deriva, de ajustamento em ajustamento, lá vamos
disciplinadamente
ao fundo.
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José Viana Dionísio (1922-2003) - Ordem (1946) |
Não são apenas os jovens qualificados a emigrar, mas
também gente desesperada com mais de 50 anos. Basta
andar na rua para perceber o estado calamitoso a que chegámos: lojas
e fábricas
fechadas, conversas fortuitas sobre profundas carências, gente
desempregada ou explorada até
ao tutano que vai desistindo
de viver. Corpos dilacerados
que os burocratas de serviço não querem ou não sabem contabilizar.
Quanto ao redentório “milagre económico” proclamado pelo
arguto Pires de Lima,
vem o FMI com o seu relatório imperial a proclamar mais austeridade
até ao dia do Juízo Final.
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Joe Jones (1909-19363) - Descarregadores (1934) |
Entretanto,
o fascismo, nas suas diversas
variantes, vem paulatinamente ocupando em vários países europeus o
lugar vazio destas fictícias democracias. O
cenário condiz com as palavras, pois, como afirma o douto dirigente
do PSD Luís Montenegro, “a vida das pessoas não está melhor, mas
o país está muito melhor”. O odor fascizante deste comentário
não deixa dúvidas. O país já não são as pessoas, mas uma
mirífica abstracção ideologizada típica dum poder totalitário. O
país é certamente, nesta óptica, um deserto apenas ocupado por
números manipulados ao sabor da estratégia desta “elite”
simultaneamente apatetada
e desumana
que nos coube em sorte, ou
melhor, em desgraça. Os corpos destroçados deste país terão ainda
capacidade para mandar estes bonifrates para o definitivo deserto de
onde por lapso dos deuses nunca deveriam ter saído? Cabe
a este povo sem rumo reencontrar-se
e dar
a conveniente
resposta.
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Dorothea Lange (1895-1965) - White Angel Breadline (A Sopa dos Pobres), S. Francisco, 1933 |
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Dominguez Alvarez (1906-1942) - Enterro Pobre (1929) |
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Renato Guttuso (1911-1987) - A Morte de um Herói (1953) |