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James Ensor - O Homem dos Sofrimentos (1892) |
O poder aposta no desgaste, nas
mãos que se vão encarquilhando ao ritmo deste tempo de números legitimados
pelas sacrais instituições financeiras que se apoderaram desta e de outras terras deserdadas de futuro. Os indignados vão cedendo a um destino, uns emigram, outros paralisam-se na impotência de agir. Dos partidos políticos fora do
chamado “arco da governação” as suas vozes de contestação perdem-se nas
neblinas da comunicação social ou nos ecos das efémeras manifestações de rua. O cansaço empurra-nos para o silêncio. As
palavras de revolta ditas e reditas perdem simbolismo. Seria talvez preciso inventar outras, ou
outros modos de as dizer. Nem que seja como um grito - uma raiva vinda das
entranhas. Não às esmolas, nem à caridade, a sopa dos pobres do reino das jonets deste mundo, mas o imperativo desejo de impor o direito à
dignidade para todos.
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Jules Adler - A Sopa dos Pobres (1906) |
Em nome da austeridade, de números manipulados
ao sabor da estratégia fundamentalista deste poder dito neo-liberal, prepara-se
uma ardilosa e radical alteração das bases deste nosso precário Estado Social. Deixem o
mercado funcionar, reduzam o Estado a um mero cobrador de impostos e à sua benigna função repressiva, dizem eles.
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Edvard Munch - Ansiedade (1894) |
Com tantos desempregados e precários acabaram-se os arrebites reivindicativos. Fechem as
escolas públicas, os hospitais públicos, a televisão pública, o ar público, as
sentinas públicas, acabem com essa coisa inútil e despesista a que chamam
cultura, privatizem os corpos não usados pelas rugas do tempo, já que estes nem
para isso servem, dizem eles. Proíba-se a melancolia, esse sentimento parasita.
Proíba-se o minguado lazer dos pobres, não o negócio do lazer para os excelsos
que enriqueceram à custa de manobras fraudulentas a coberto dos interesses
partidários e das poderosas máfias.
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Marcel Gromaire - O Desempregado (1936) |
Erotismo para os ricos, não para os trabalhadores, uma perversa fonte de perda de produtividade. Venham os escravos dos tempos modernos! Acelere-se o fim dos eufemisticamente chamados idosos cuja longa
vida se tornou um encargo insuportável para o nosso caduco Estado-Providência,
dizem eles. O poder precisa mais do que nunca de almas submissas, trespassadas
pela lusitana tradição do Fado, não de cidadãos, na sua óptica, meras máscaras
construídas pelos diabólicos vermelhos e afins.
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Peter de Francia (1921-2012) - Diário do Nosso Tempo |
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Louis Le Nain - Le Bénédicité (1642)
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Mas para os bancos, meu Deus, que são o
coração intrépido desta nossa odisseia, que nunca falte a solidariedade
abnegada do tesouro público, sempre que as suas trapaças os coloquem à beira do
abismo. O mundo é dos fortes, dos fracos não rezará a História. Proliferem as
sopas dos pobres, como mil flores primaveris, nobilita os dadores e cria nos
humildes a benção sagrada da dádiva. Os homens sem direitos tornam-se os
números dos nossos apetites insaciáveis. Assim dizem eles.
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Paul Delvaux - O Congresso (1941) |
Riem o Relvas, o
Moedas, o Passos e o Gaspar e os outros pastores, desta nova Igreja, daqui e da
estranja. Riem os ricos cada vez mais ricos e os seus abnegados servidores. Acabe-se
de vez com este país de pobres com vícios de ricos. Dizem Eles…
E nós? Estaremos condenados ao silêncio?
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Peter de Francia - A Nave dos Loucos (1972)
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Edvard Munch - Operários a Caminho de sua Casa (1913-15) |
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Edvard Munch - Melancolia (1892-93) |
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José Clemente Orozco - Deuses do Mundo (1932-34) |
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Ilia Répine - Os Sirgueiros do Volga (1870-73) |
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Murillo - O Jovem Mendigo (1645-55) |
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Francis Gruber - Job (1944) |
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Van Gogh - Três Pares de Sapatos (1886-87) |
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Jean-François Millet - A Rajada (1871-73)
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